quinta-feira, julho 17, 2003
Mais Torga...
[ainda vou ser processado por alguém...]
Coimbra, 3 de Novembro de 1936 – Grande discussão sobre a mania que a posteridade tem de publicar cartas íntimas de escritores mortos.
Defendi, já se vê, que era um atropelo ao respeito que se deve a um homem, tornar público o que nele foi particular. Eu bem sei que o particular, na pena dum homem de letras, nunca é uma sangria desatada de tal ordem que não haja sempre duas regras do Vieira a doirar a pílula. Seja porém como for. Tenha ele escrito com sinceridade ou não, com gramática ou não, com os olhos profissionais postos no futuro ou não, salvas aquelas excepções em que as circunstâncias o exijam ou o autor o estipula, custe o que custar, doa a quem doer, perca-se o que se perca, nada do que um escritor não quis publicar em vida deve ser publicado depois da morte.
E escusam de me argumentar com a verdade que muitos livros póstumos enriqueceram o património da humanidade e a glória dos seus autores.
Cá para mim, a humanidade nem tem o direito de tirar ao individuo aquilo que ele espontaneamente lhe não deu, nem de lhe engrandecer o nome contra vontade.
Miguel Torga, Diário I – Coimbra, Ed. Autor
Há uns tempos quando li “O Jardim do Éden”, obra póstuma de Hemingway, fiquei exactamente com esta sensação.
Coimbra, 3 de Novembro de 1936 – Grande discussão sobre a mania que a posteridade tem de publicar cartas íntimas de escritores mortos.
Defendi, já se vê, que era um atropelo ao respeito que se deve a um homem, tornar público o que nele foi particular. Eu bem sei que o particular, na pena dum homem de letras, nunca é uma sangria desatada de tal ordem que não haja sempre duas regras do Vieira a doirar a pílula. Seja porém como for. Tenha ele escrito com sinceridade ou não, com gramática ou não, com os olhos profissionais postos no futuro ou não, salvas aquelas excepções em que as circunstâncias o exijam ou o autor o estipula, custe o que custar, doa a quem doer, perca-se o que se perca, nada do que um escritor não quis publicar em vida deve ser publicado depois da morte.
E escusam de me argumentar com a verdade que muitos livros póstumos enriqueceram o património da humanidade e a glória dos seus autores.
Cá para mim, a humanidade nem tem o direito de tirar ao individuo aquilo que ele espontaneamente lhe não deu, nem de lhe engrandecer o nome contra vontade.
Miguel Torga, Diário I – Coimbra, Ed. Autor
Há uns tempos quando li “O Jardim do Éden”, obra póstuma de Hemingway, fiquei exactamente com esta sensação.
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